Esposas de presidiários : Cárcere em liberdade !

ONG Pacto Social & Carcerário São Paulo


ESPOSAS DE PRESIDÁRIOS :CÁRCERE EM LIBERDADE 

“Tudo está fluindo. O homem está em permanente reconstrução; por isto é livre: liberdade é o direito de transformar-se.” (Lauro de Oliveira Lima)
          Todos as semanas, uma multidão acumula-se em frente aos portões de prisões, penitenciárias e delegacias espalhadas pelo Estado do Maranhão, carregando pacotes de bolachas, refrigerantes, pizzas e outras guloseimas típicas, sem uma mínima estrutura, de abrigo, nem sanitária, estão no tempo, sol, chuva, frio... São os parentes dos maranhenses presidiários (1).
          As visitas custam caro para os familiares. Além do gasto com transporte, soma-se a despesa com a refeição do dia. Na maioria das vezes, também é a família que fornece ao detento sabonetes e outros produtos, como creme dental e papel, para suprir suas necessidades básicas de higiene. O dinheiro para essas compras falta em casa. Além de se adaptar à vida sem um de seus membros, a família tem que se adaptar às normas e regras do presídio. Percebe-se neste sentido a prisão como forma de disciplina através do poder sobre o corpo não somente dos reeducandos como também de seus familiares.
          O afastamento de um de seus membros (na maioria dos casos o homem) provoca importantes rearranjos nas relações sociais. Diante da prisão a família se vê em uma nova situação: Como, por exemplo, garantir a sobrevivência dos demais membros, lidar com os problemas de revolta dos filhos, preconceito da sociedade em relação à família de preso e às normas e imposições da própria prisão, visto que a família acaba sendo inserida no jogo de poder das práticas prisionais.
         Frente a toda esta problemática percebemos que a família ou acaba depositando nas mãos do reeducando e da sociedade a solução para todos seus problemas, ou então as famílias passam a articular diversas atividades para enfrentar o afastamento do familiar preso, como manter os laços de parentesco e vizinhança estreitos, a fim de "ajudarem-se" mutuamente, ou desenvolverem alguma atividade que lhes proporcione alguma renda, sendo que a maioria das atividades exercidas no mercado de trabalho são empregos mal remunerados e que não exigem formação específica, ou até mesmo inserem-se em programas de auxílio à população de baixa renda.
          Nessas famílias compostas por mãe e filhos as crianças entram muito cedo no mercado de trabalho, o que resulta em mau aproveitamento na escola e alto índice de repetência. Quase todas as crianças abandonam a escola muito cedo e se transformam em analfabetos funcionais
          Para a sociedade não existe “ex-bandido”, dessa forma a segregação de familiares de presos é muito comum, como se a pena pudesse estender-se aos ascendentes, descendentes e cônjuge do sentenciado. A vergonha pelo crime que alguém cometeu ou o medo do preconceito faz com que os parentes, às vezes, ocultem ou minimizem a gravidade do ato que levou à condenação.O preconceito também é explicitado pelos funcionários do sistema prisional. As mulheres que visitam familiares e amigos nos presídios são vítimas de situações constrangedoras e humilhantes e, em geral, são maltratadas e alvo de piadas grosseiras.
          A Justiça condena o criminoso, mas a condenação da sociedade, da família e dos vizinhos não tem tempo definido para acabar. Dessa forma, essas famílias ficam esquecidas e também  à mercê  do crime organizado. A grande maioria apresenta um sentimento de passividade e em relação à saída do familiar da prisão, no sentido de que este resolva a situação econômica, os problemas com os filhos, depositando a vida da família nas mãos dos reeducandos. Sabemos que estes ao saírem não conseguem prover todas essas necessidades.
          Sendo assim, a estigmatização do ex-presidiário é um dos fatores que dificultam sua reintegração o que acaba provando sua nova exclusão e conseqüentemente, o retorno à vida do crime e possível e provavelmente à vida no cárcere em algum momento futuro. Esse contexto afeta toda a sociedade que recebe os indivíduos que saem desses locais da mesma forma como entraram ou piores. Ou seja, A situação nos presídios brasileiros é caótica e não atendem às finalidades essenciais da pena quais sejam punir e recuperar. É necessário que sejam implementadas políticas públicas voltadas para a organização desse sistema e promover uma melhor efetivação da Lei de Execução Penal.
            Nesse contexto cresce a importância da adoção de políticas que efetivamente promovam a recuperação do detento no convívio social e tendo por ferramenta básica a Lei de Execução Penal e seus dois eixos: punir e ressocializar. A falta de políticas públicas e o descaso com as normas já existentes fazem com que a reintegração se faça cada dia mais longíqua do que se necessita; pertinente se faz uma reavaliação do que se tem e do que se precisa e mais do que ficar no papel dar sentido prático às propostas que existem em relação a essa recuperação e as que já estão sendo discutidas.
            Enfim, a família não deve ser vista como uma mera vítima estática da aplicabilidade da Lei que a pune compulsoriamente; ela deve ser percebida como peça-chave para o trabalho de diminuição da reincidência.  Não perceber a importância da família nesse contexto é não investir na possibilidade de resgate, na diminuição da reincidência, no retorno da violência a níveis aceitáveis. Tal atitude traz a família para o centro das discussões como mais uma possível parceira, trabalha a sua auto-estima, agrega valor ao trabalho feito nos Estados e oferece sustentáculo estrutural para futuras relações dessa família, que, a partir dessa visão, inclusive passará a se perceber cidadã.